sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

Àqueles que nada querem aprender.

SOUBE QUE VOCÊS NADA QUEREM APRENDER

Soube que vocês nada querem aprender
Então devo concluir que são milionários.
Seu futuro está garantido - à sua frente
Iluminado. Seus pais
Cuidaram para que seus pés
Não topassem com nenhuma pedra. Neste caso
Você nada precisa aprender. Assim como é
Pode ficar.

Havendo ainda difuculdades, pois os tempos
Como ouvi dizer, são incertos
Você tem seus líderes, que lhe dizem exatamente
O que tem a fazer, para que vocês estejam bem.
Eles leram aqueles que sabem
As verdades válidas para todos os tempos
E as receitas que sempre funcionam.
Onde há tantos a seu favor
Você não precisa levantar um dado.
Sem dúvida, se fosse diferente
Você teria que aprender.

Bertold Brecht.

Acho extremamente nocivo o desinteresse das pessoas. O desinteresse por tudo. Até pelo próprio curso. Estudo na famosa Universidade de São Paulo, a maior universidade do país e, quiçá, da América Latina. Apesar de todos os problemas (principalmente para nós, da FFLCH, e mais ainda para a Letras, que é o maior curso), ela ainda nos oferece um enorme leque de opções, que, querendo ou não, é único. Impossível não ficar fascinado com todo o conhecimento que se pode tirar de lá. E impossível não desanimar quando se vê que não é possível fazer todas as matérias que queremos.
Mas a realidade é muito diferente. Não se discute nada para além da sala de aula. Nada de discutir os conteúdos do curso, que dirá algo de política. Não parece que estudamos Literatura, Linguística... não parece que estudamos. Ponto. Muito menos que estamos na faculade mais mobilizada da USP. Grande parte dos alunos parece ainda estar no colégio: estuda por obrigação, apenas para passar de ano. Nem há nem preocupação com uma boa nota.
Diante disso, me pergunto: para que raios tanta comemoração ao passar no vestibular? Para se comportar da mesma maneira que aos 14 anos?
Estamos na faculdade, pelo amor de deus! Não acho certo levar o colégio com a barriga, mas pelo menos tem a desculpa de, na maioria das vezes, ser desinteressante, da escola no Brasil ser um lixo... mas na faculdade nós estamos, ao menos teoricamente, no curso que queremos. Não há como alguém não se interessar minimamente pelo que vemos lá.
As pessoas simplesmente não conseguem ter uma conversa minimamente séria. Depois me perguntam como consigo "discutir ideologia pelo orkut". Mas é claro que consigo. Nunca há nenhuma e, quando tem, é de se comemorar.
Se não há discussão, que dirá ação. Qualquer um que resolva se levantar contra o statuos quo é visto como uma ameaça. "Cuidado com a lavagem cerebral dos militantes", dizem. "Cuidado com a esquerda", "a esquerda é malvada e só sabe xingar quem discorda dela.". Só sabem chorar e ofender, não sabem discutir politicamente alguma coisa. Se você diz para a pessoa "olha, leia tal texto", ela se ofende, dizendo que você a está chamando de incompetente.
Oras! Não estamos na faculdade para estudar? Por que todos se consideram prontos? Será que acham que o estudo é só na sala de aula? ESSAS PESSOAS NÃO LÊEM?
Não relacionam seu curso com a realidade à sua volta. Oras, como querer estudar Letras sem saber o que se passa na política de seu país? O que é essa divisão? Nós estudamos Antonio Candido! O que é preciso pra essa gente se mexer? Que ele vá lá e diga "levantem sua bunda daí e vão protestar"?
O pior é que as pessoas se orgulham disso, de serem medíocres. Estufam o peito e dizem "eu não sei o que se passa no mundo e nem quero saber".
Simplesmente não consigo entender. Como alguém pode ficar quieto dirante de tudo o que acontece? Nosso curso está sendo jogado na lata do lixo na nossa frente, e as pessoas só sabem dizer "melcu"? É isso que tem na FFLCH? É nisso que lutamos tanto pra entrar?
Só me resta afirmar, com tristeza, que a Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, famosa por suas grandes contribuições para o país (com exceção de um certo ex-presidente...), acabará formando alguns dos maiores analfabetos políticos do Brasil.

Enfim, nenhuma análise política profunda. Apenas um desabafo.